quarta-feira, 26 de setembro de 2012

Conversa com a Duda

 Há cerca de um mês, Porto Alegre estava tomada de ipês roxos em flor. Era uma verdadeira festa para os sentidos. Onde você menos esperava, em uma esquina qualquer, no meio de uma avenida barulhenta, nas praças, no parque da Redenção ( foto). Por todo o lado, uma explosão de cor. Lindo, simplesmente. Não havia quem não percebesse. Impossível não se deslumbrar.
 Conversando com uma amiga justamente sobre a beleza destas árvores e da cidade nesta época,  ouvi o seguinte comentário, da filha dela, de 8 anos:"lindo mesmo, pena que depois a gente esquece, né? E nem vê mais". Eu respondi: a gente não esquece. Acostuma. E quando a gente se acostuma, a gente deixa de ver. Aliás, isso vale para praticamente tudo em nossas vidas, desde objetos até pessoas e relacionamentos. Com o tempo, se não estamos atentos, a gente para de enxergar. Não percebe mais o que está à nossa volta, por costume e hábito. Passa pela rua sem perceber a flor amarela, o cachorro manco, o buraco no chão. Cai na calçada e ainda se pergunta como. Entra em casa sem ver o sofá rasgado, o gato malhado, o amor esfomeado. Prepara um prato qualquer e depois não entende porque o amor foi embora. Pela janela, junto com o gato. Deita no sofá e é atingido pela mola, que escapa do buraco, que não percebeu.
 A força do hábito nos rouba a visão. Rouba a capacidade de nos encantarmos com uma rosa, uma árvore, um sorriso. Rouba o encanto,e o prazer. De olhar para tudo com olhos de início. Leva nosso olhar curioso e apaixonado. Que pena! Quem dera pudéssemos, todo dia, passar pela vida absorvendo cada detalhe e cada cor e cada cheiro. Vendo e absorvendo todas as flores. Sem nos acostumarmos, nunca. Não, Duda, a gente não esquece. Mas acostuma,  e deixa de ver. Ou talvez sim, a gente esqueça. Esqueça de aproveitar enquanto temos. A gente não lembra que tudo passa. E sabe? Os ipês roxos não estão  floridos agora. Não mais. Passaram.

Nenhum comentário:

Postar um comentário