terça-feira, 31 de julho de 2012

Dia de chuva

Um dia de chuva também pode ser necessário. Poder andar sob a chuva e ainda assim ser capaz de se sentir feliz. Poder ficar em casa olhando pela janela a chuva que lá fora cai. Observar os pingos que escorrem pelo vidro, fazendo estranhos caminhos, e ainda assim ser capaz de se sentir em paz. Não fosse a chuva não cresceriam as plantas, os bichos, os homens. Pois dias de chuva são também necessários para que cresçam os homens. Para que afoguem as dores. Para que floresçam alguns amores. Para que se reconheça o sol. Para se lavar a sujeira, das ruas e da alma. Para que se aceite todas as cores, sem distinção. Tempestades, chuviscos, garoa, dias nublados. Não importa a cara que o seu dia de chuva tenha. Ele também é necessário. Necessário e passageiro. Porque, pode até demorar um pouco, mas um dia a chuva para. E aí o sol aparece. Com sorte, pode até mesmo haver um arco íris. Ou, quem sabe, um tesouro escondido, lá no final. Porque no fim, é sempre assim. Sempre fica tudo bem no final.

sábado, 28 de julho de 2012

Definitivamente

Eles dirigem do outro lado da rua.  Eles não usam quilos, metros, e estas outras medidas que o resto do mundo usa.São pounds, inches, miles, coisas assim. As roupas e os sapatos também tem uma numeração toda própria. Eles não tem uma moeda comum, sua libra é só sua. Os ingleses. São únicos, definitivamente. Com suas casas de tijolinhos vermelhos, seus pequenos jardins cheios de rosas, sua grama tão verde que dá inveja a qualquer vizinho. Porque não tem verde como este, disso eu tenho certeza.Os ingleses são únicos. Com sua educação, sim por favor, não obrigado, sua boa vontade para dar informações e uma gentileza sem medidas. Com suas xícaras de chá com leite, e suas tradições ancestrais. Com suas igrejas e museus e parques. E suas ruas limpas e seu transito ordenado. E civilizado. Únicos em sua adoração pelo sol, tão raro e tão celebrado por estas bandas. Únicos no modo de se vestir e na maneira de não se importar em como se vestir. Aqui você pode ser qualquer coisa,  o que quiser ser, do jeito que for. Ninguém se importa. Únicos em respeito pela individualidade. Pelo indivíduo. Únicos na música. E no humor. O humor ingles é imbatível. Nem tudo são flores, claro, mas são tantas e tantas flores, muitas, para compensar.E tem a grama. A grama.Que é mais verde, definitivamente.

sexta-feira, 20 de julho de 2012

Sobre fins e começos

Todo começo é bonito. Todo fim é triste. Bom, geralmente.E no meio do caminho tem a vida. Que não é tão bonita nem tão triste. Que é apenas a vida.Mas a gente se apega. Nos começos. E detesta os fins. Briga para manter um e evitar o outro.Quanta ilusão.Um não existe sem o outro. Um acontece para o outro acontecer.E vice versa. Sempre. Roda da vida. Roda viva. Nenhuma certeza. Ou só uma certeza. Sempre existe um começo. E este começo significa um fim. Lá no final. Ou bem antes. Nunca depois.

quarta-feira, 18 de julho de 2012

Você fala demais

 Às vezes você fala muito. Quase sempre. Porque você acha as palavras, sempre. E isto pode ser um pouco irritante. Sempre achar as palavras. Acertar em cheio. Isto é um pouco chato, você sabe. Cansa. Você quer falar, muito.  Quer ouvir também. Como se as palavras tivessem poder por si. De curar as dores. De dar garantias. Não tem, né, e você sabe disso. Você sabe melhor do que ninguém. Que elas são peças de um jogo, nada mais. Porque tem coisas, muitas, para as quais não há palavras. Coisas enormes, que não cabem no alfabeto . Que só podem ser lidas nas entrelinhas. Coisas boas demais para serem formatadas em letras e frases e discursos. Coisas tristes demais para se dizer. Coisas inevitáveis que você tenta evitar gritando, como se grito funcionasse. Você olha, e vê, e quer falar. Quer gritar cuidado, não pisa aí! Mas sabe que não adianta, que por mais que você conheça as palavras, elas vão cair no espaço vazio da surdez. Não vão ser ouvidas, porque você fala demais. Não entende que o silêncio abre espaços.Ou entende, e se assusta. Você tem medo do que não pode ser dito. Tem medo do que isso significa. Deste espaço. Porque lógico que você sabe as palavras, você sempre sabe. Mas não pode dizer,não desta vez. E não quer ouvir.

quinta-feira, 12 de julho de 2012

Carta para Isabella

  Dear Isabella
Seja bem vinda docinho. Welcome honey.
Você é uma menina de sorte.
You are a lucky girl.
Sonhada e desejada.
Loved even before your conception.
E concebida com muito amor.
Gerada com todo carinho.
Nascida com tanta coragem.
Today is a special day.
Because this is the day of your birth.
Uma pequena flor inglesa.
An english lady, indeed.
(How proud your grandma would be)
Você é mesmo uma garotinha de sorte.
Nasceu em uma familia especial.
You are very lucky.
Voce tem duas mamães.
And the two of them are very brave.
São fortes e são doces e são lindas.
Como você, Isabella, just like you.
Desculpa esta carta confusa, e este inglês fraquinho.
É só sua tia, antevendo o futuro.
E misturando tudo, num texto bobinho.
Porque hoje, Isabella, as palavras me faltaram.
Fugiram.
Have no words to say.
( But have to )
How happy I am.
Por você estar aqui.
Welcome little angel.
Bem vinda docinho.
We`ve been waiting for you.
    lots of love,
Tia Dani (your auntie)



quarta-feira, 11 de julho de 2012

A fórmula da coca-cola?


Não me coloque rótulos, por favor.
Não sou produto de consumo.
Se nem eu sei de que sou feita, como saberá você?
Sou carne, sou alma e coração, e isto é fato. Em doses variáveis, algumas vezes mais alma, outras mais carne, mas sempre muito coração. Sou cérebro, também, embora nem sempre na medida certa. Às vezes falta uma ou duas medidas. Às vezes sobram estas mesmas medidas. Algumas vezes está tudo certo. Na maioria das vezes não.
Esta é a composição básica.
Os outros ingredientes são como a fórmula da coca-cola. Secretos. Indecifráveis. E para falar bem a verdade, completamente instáveis. Um pouco louca. Muito louca. Completamente lúcida. Azeda e doce. Um pouco de cada, ou muito de um. Depende.
Apaixonada e indiferente. Responsável, inconsequente. Apegada. Atirada.
O que você quiser. O que eu precisar. Muitas ou apenas uma, sempre única. Você até pode me consumir. Mas não adivinhará a fórmula. Não existe fórmula. Não existe forma.
Sou feita de improvisos. Não me coloque rótulos. O que você vê é apenas o que você vê. E eu? Eu sou variável. Obscura, indefinível, imperfeita.
E orgânica.

Dani Altmayer

terça-feira, 10 de julho de 2012

Se ela fosse um livro


Se ela fosse um livro, com certeza seria um livro de autoajuda. Desses bem óbvios. Do tipo que você gosta de pegar num momento de aperto, só para ler tudo o que você já está careca de saber. Conforta por uns instantes. Pode até ser legalzinho e bem escrito, mas largou, esqueceu.
Era assim que ela se sentia. Óbvia. Disponível. Fácil de esquecer. Sempre tentando agradar. Bonitinha, uma feia arrumadinha. Tão querida. Descartável.  
Não que ela mesma nunca tivesse lido um desses livros. Claro, já tinha lido vários. Assim como já lera horóscopo, revista de fofoca, Sabrina e Bianca, e uma dúzia daqueles  romances açucarados de bolso. Tem horas que, né?  
Não custa. É como banho de sal grosso, você pode nem acreditar, mas mal não faz. Então, essa era ela. Não era burra. Só, sei lá, óbvia. 
Útil e confortável, um pouco ingênua. Mas inofensiva. Como um banho de sal grosso, um livro de autoajuda: uma melhor amiga. Gente boa. 
Deixada de lado ao menor sinal de uma história mais interessante, mais picante, ou envolvente. Largada às pressas por qualquer suspense, biografia ou romance épico. Conto erótico ou revista em quadrinhos.
Um bom mistério e ela é esquecida na estante, colocada em modo de espera, até a próxima crise existencial. Até ser necessária, de novo.
Ela e suas páginas sem erros, tão perfeitinhas, de uma clareza quase indecente. Autoexplicativa demais. Irritante, cheia de vírgulas, travessões e novas linhas.
Fácil demais de se ler. 
Ela, que tinha uma admiração explícita pelos livros do Saramago, sem pontuação nenhuma. Achava inquietante. Ela, que tinha uma inveja secreta de quem vai indo de qualquer jeito, comendo os pontos, engolindo as vírgulas, esquecendo os acentos. Atropelando a língua. Dos intrigantes e dos loucos. Repletos de dor, e significados ocultos. Instigantes, indecifráveis. 
E inesquecíveis. 
Tinha ânsia de viver assim... Cheia de reticências, nas entrelinhas. Sem pontos finais, em linhas corridas. E sem crases, definitivamente. As crases atrapalham o fluxo. Entre aspas, né? Entre aspas.

Dani Altmayer

sábado, 7 de julho de 2012

É inverno no Sul

A janela está embaçada, mal se consegue ver a rua. Faz frio lá fora, e chove. Chove muito. Há pouco começou a ventar também. Sei disso pelas árvores da praça aqui em frente. Olho para a janela, e sinto frio. Mesmo sem sentir. Porque aqui dentro está quentinho. Por isso o vidro está embaçado. Olho pela janela o inverno do sul. Chuva, vento e frio. E sinto frio, mesmo sem sentir. Porque pela janela  embaçada, só consigo distinguir o vermelho berrante dos táxis e lotações. O resto é uma massa indefinível e sem cor e sinto nos ossos o vento gelado que na verdade não sinto. Adivinho. E as pessoas passam lá embaixo com seus guarda chuvas pretos virados pelo vento, a cabeça baixa, os cabelos molhados grudados em suas caras. Encolhidos em seus casacos pretos. Desviam uns dos outros e dos pingos grossos da chuva que não para nunca. É inverno no sul, e lá fora todos correm, e desviam.Não ouço o barulho do vento, mas adivinho. E me arrepio, lembrando do Minuano inclemente da minha terra. Terra onde o vento canta.  Um assovio sinistro de um canto triste. Sempre me pareceu que aquele vento perturbava um pouco as idéias da gente, naquela terra de praia sem fim. A mim perturbava. Aqui o vento não canta como lá. Mas é inverno e é sul,  ainda que não extremo. E da minha janela embaçada adivinho o frio que lá fora faz,  mesmo estando quente aqui. Sinto frio na alma. E penso que as almas, como as andorinhas, devem migrar em busca de lugares mais quentes do que esta Porto Alegre úmida e gelada de início de julho. Acho que abandonam os corpos com seus guarda chuvas e casacos pretos e cabelos molhados. E por isso todos passam apressados e desviam, com pressa. Resultados de um frio que rouba a alma . Personagens sombrios de um quadro  impressionista, às avessas.

sexta-feira, 6 de julho de 2012

Afogamento

Preso em um labirinto. Tentando achar uma saída. Sem conseguir ordenar pensamentos. Desconexo. Refém no labirinto de sua cabeça. Como se todos os sulcos e giros de seu cérebro estivessem preenchidos por um líquido viscoso. Atrapalhando conexões.Sem nexo. Caleidoscópio de idéias sem sentido.Tentando desesperadamente não se afogar na lama em que se tornou sua mente. Uma massa disforme e inchada. Sem neurônios funcionantes.Quase afogado por tanta sujeira. E tanto remédio. Para dormir. Para pensar. Para sorrir. Mesmo assim não dorme. Nem pensa. Sorri, com os dentes.Sente dor para sorrir, os dentes estão trincados.Sente dor, e não sente. Há meses não sente nada.Não sente fome, nem frio, nem calor. Só vontade de fugir.De achar a saída de seu labirinto. Mas não consegue caminhar, a lama gruda em seus pés como areia movediça. Prefere ficar parado. Já não chora mais. Cansado. A cabeça dói,  e pesa, mas não sente a dor.Só o peso. Tanto esforço. Sua cabeça com cem quilos de merda,  preenchendo cada sulco e cada vão do seu cérebro.Pensa em parar com os remédios. Ou em tomar todos. Respira fundo em busca de ar. Mas o ar não existe. O ar  também é  um líquido viscoso e sujo que penetra em suas narinas, e chega aos pulmões, e volta pela boca,  um vômito desesperado de alguém  que está morrendo. Sufocado.

quinta-feira, 5 de julho de 2012

quarta-feira, 4 de julho de 2012

Quando menos se espera


Um rosto sem nome. Era assim no princípio. Todo dia ela o via passar. No começo, não prestava atenção. Estava, como gostava de dizer, fechada para balanço. E ele era apenas mais um dos tantos rostos que via passar todo dia na sua vitrine. Milhares de rostos. Um rosto sem nome. Comum, igual a tantos outros. Mas ele passava todo dia. E se alguém passa todo dia na sua janela, você começa a perceber. E ela começou a reparar. No horário, sempre o mesmo. Nas roupas. No jeito de andar. No sorriso torto. Um dia ele parou para dizer bom dia. Puxou uma conversa boba sobre o calor e "será que hoje chove'? Algo assim. Bobo. Ela não deu assunto, não estava interessada. Fechada para balanço. Sem prazo de reabrir. Estava feliz assim. Ela com ela mesma, depois de tantos anos. Mas ele não se incomodou. Com sua cara amarrada, com seus braços cruzados. Com suas desculpas esfarrapadas. Ele vinha, todo dia. Bom dia. Como vai. Todo dia.Insistente. Todo dia, aquele sorriso torto. Depois de um tempo ela já quase esperava. Já quase sorria. Depois de um tempo, já quase gostava. Ele dizia coisas para ela. Coisas bonitas, doces, bobas também. Depois de um tempo ela já esperava. Já sorria. Sorria até mesmo sozinha. Das coisas bobas e doces que ele dizia. Já gostava. Daquele sorriso. Daquele rosto tão diferente de todos os outros. Um rosto, ainda sem nome. Mas só até hoje, no mesmo horário. Hoje no bom dia, ela ia dizer: "me chamo Maria, e você?" Um nome, ela queria. Fechada, tinha esquecido um detalhe. 
Frestas. Ele tinha entrado pelas frestas.

Dani Altmayer

terça-feira, 3 de julho de 2012

Por Todas as Vezes

Então era isso. O fim. Que estranho, fazia uma idéia diferente de um fim. Mais passional, sei lá. Como das outras tantas vezes. Não aquele nada. Mas talvez fosse assim, e alguns fins não doessem. Quem sabe só doa quando ainda não é fim. Os ses e os quem sabe, estes ela sabia que doíam.As incertezas. Mas ela nunca esteve tão certa como naquele momento Ela olhou para aquele rosto que conhecia tão bem. Olhou para os copos pela metade e os cinzeiros cheios. E nada. Vazio. Tudo oco. Só um gosto amargo na boca. Como ela imaginava que seria o gosto de um fim. Mas nem isso. O gosto não era do fim,era do cigarro. E do uísque.
Lembrou de todas as vezes que pediu desculpas, para ele e por ele. Lembrou de todas as desculpas que inventou. Por ele. E desta vez não teve pena. Ele ainda queria entender. Ela estava vazia. Vazia de memórias, e vazia de emoção. Era como se, de uma hora para outra, nada daquilo fizesse  sentido. Nenhuma palavra, dita ou pensada, mudaria o fim.Olhou para ele, e de tudo que poderia ter dito, só disse o que tinha sobrado.Sem pena.
"Você consegue me ver?


 Por todas as vezes que você me olhou e não me viu. Porque, para ver, não basta ter olhos. Assim como, para ler, não basta saber as letras. É necessário entender. Analfabeto funcional, é isso que você era. Nunca aprendeu. Analfabeto emocional. Você me olhava, mas nunca soube me ler.Não entendeu.

            As luzes se acendem. O filme acabou. A tela fica em branco. FIM.

Vale tudo

Vale começar regime na sexta feira.
Vale parar de fumar no sábado.
Vale se apaixonar aos 80.
Ou ter um filho com 40. 
Vale mudar de casa.
De país.
De profissão.
Vale mudar de estilo.
De sexo.
De opinião.
Vale traçar metas.
Em 31 de dezembro.
Ou em qualquer dia.
De um mês qualquer.
Vale não cumprir nenhuma.
Vale, e muito, atingir apenas uma.
Vale ter razão.
E vale não.
Só não vale desistir.
Do ir e vir.
Vale tudo.
Só não vale esquecer.
De que tem coisas.
Que fazem tudo valer.

segunda-feira, 2 de julho de 2012

Dor de crescimento

Sabe aquela dor de crescimento, nas pernas, que as crianças tem, geralmente à noite? Pois é. Adulto também tem. Mas não é a perna que dói.É  que crescer dói. Em qualquer idade.Na criança o que dói são as pernas, pelo crescimento rápido dos ossos, cartilagens, articulações, estas coisas. Já o adulto dói por outros motivos. em outras partes do corpo.Dói porque crescer dói. Sempre.
Tudo que se vai deixando para trás , de bom e de ruim, de certa forma dói também. Todas as pequenas e  grandes alegrias, eventos importantes, festas, casamentos, formaturas. Todos os nascimentos.E todas as pequenas e grandes perdas, mudanças, separações, mortes e funerais. Tudo que se vai adquirindo dói também. Todo o verniz e máscaras e contas para pagar. Entre a infância e a idade adulta, em nome de uma tal maturidade, vamos largando algumas coisas e pegando outras. Este largar e pegar, ele dói também. Porque este largar e pegar significa fazer escolhas. E escolhas doem, invariavelmente. Mas acho que o que mais dói de verdade é a perda da alegria.Não de uma alegria qualquer, mas daquela alegria da criança. Pura e cristalina, e doce . Como a gargalhada de um bebê. (Tem coisa mais gostosa?) A gente vai crescendo e vai se levando tão a sério. Esquece de brincar. Esquece da criança que ainda somos, e sempre seremos. Ou alguém não reparou que não passamos de crianças fingindo ser gente grande? Brincando de casinha, de papai-mamãe, de executivo sério? Colocamos os saltos altos de nossas mães, seus colares, e as gravatas de nossos pais e saímos.  Um grande faz de conta. Fingindo ser gente grande. Jogando nossos jogos de tentativas e erros, meio sem regras e sem sentido. Criando expectativas e frustrações e guerras, de todo tipo.E esquecendo como se brinca. Crianças grandes e tristes, que esqueceram. Esqueceram que a grande brincadeira é fazer castelos na areia.Castelos bem lindos e altos, que o mar vai levar. Vai levar o castelo e trazer conchinhas. E você vai sentar de novo, na areia, e construir mais um castelo, enfeitado com estas conchinhas. E o mar vai levar tudo de novo, e você estava achando tão lindo, até fica um pouco triste. Mas você sorri porque sabe que a brincadeira é assim.De novo, e de novo, como as ondas quebrando na beira da praia. Como naqueles jogos de pecinhas de montar. Você constrói uma torre bem alta, e depois derruba, apenas para construir outra maior e mais bonita, e esta é toda a graça da brincadeira. Poder desmanchar e fazer de novo. E se encantar a cada vez. Mas nós, crianças grandes, esquecemos de brincar. Só sabemos jogar nossos jogos neuróticos Por isso, nossas pernas não doem. Mas sentimos dor, muitas vezes, e geralmente à noite, também. Não doem as pernas..Dói nosso coração, apegado e maduro. Dói a dor da saudade das ondas do mar. Dor de crescimento. Ou nostalgia.