sábado, 30 de novembro de 2013

O Acaso que Nos Protege

Ontem eu recebi uma notícia boa. Para falar a verdade, eu não a recebi. Eu a encontrei, quase por acaso, se acaso houver. O que me fez lembrar da música: "o acaso vai me proteger, enquanto eu andar distraído".  E já me distraio, cantando, desafinada, o refrão na minha cabeça. Sou assim.
Então, voltando. Ontem eu encontrei esta boa notícia. O meu nome no segundo lugar de um concurso nacional de micro contos, do qual já nem lembrava que estava participando. Sabe aquela coisa de última hora, quando você pensa, por que não? Foi assim. Sem expectativas ou pretensões, que enviei uma pequena história. E foi assim, vagando pelo facebook, distraída, que encontrei a minha boa notícia. Difícil descrever a sensação ao ver o meu nome ali, naquela lista. Tem certificado, até prêmio em dinheiro, mas não lembrei de nada naquele momento.
Só o que podia pensar era em gratidão. A boa notícia não podia ter vindo em melhor momento. Veio para me lembrar que há sempre um motivo para agradecer. Que a alegria é possível mesmo em meio à mais profunda dor. É possível sorrir chorando, e ser feliz estando triste. A vida dá e leva, o tempo todo. Expande e contrai, como nas batidas de um coração. Sístole e diástole. Altos e baixos. Isso é estar vivo. E é nestas subidas e descidas que a gente vai fortalecendo, as pernas e o espírito. Encontrando o equilíbrio preciso.
Hoje eu queria agradecer, simplesmente. Espero que este seja o primeiro de muitos passos, porque amo fazer isso que faço. Mas se não for, já está valendo. O significado desta boa notícia é outro. Enquanto houver corações batendo, enquanto houver acasos, e gente distraída, e sonhos para se sonhar, há possibilidades. Infinitas. Há esperança.
Queria agradecer a todos os que vibraram junto comigo, porque não tem nada melhor do que compartilhar alegrias. Obrigada por todas as mensagens, e palavras de incentivo, vocês não imaginam a diferença que isso faz. Coisa boa estar assim, distraída, e "tropeçar"em tanta gente legal por aqui. Valeu!

domingo, 24 de novembro de 2013

Reticências

Rio,1981

(...seis anos se passaram...)
O relógio marca as horas. O calendário, as semanas e os meses.
A vida, a gente marca em outra folhinha.
Marca no diário dos afetos bons, das dores inevitáveis, dos micos e alegrias impagáveis. Das conquistas compartilhadas.
(... coisas assim...)
No caderno das rugas adquiridas, dos sonhos perdidos e renovados. Em encontros especiais.
No cotidiano dos desencontros, desenganos, tropeços e recomeços. Nos fios de cabelo branco, no filho que passou da mãe.
(... crescemos, enfim...)
Assim é que se conta o tempo. Em histórias que nunca terminam.
( ... temos tanto para te contar...)
Regando lembranças, nasceram crianças, criamos jardins. Mudamos de ideia.
(...mudamos de lugar...)
Seis minutos, seis dias, seis anos. Tanto faz.
Existe um tempo que não se mede pelo sol.
Tem outra rotação.
É tempo que não troca de estação, que nunca vai embora.
Que não muda com a mudança, eternizado está, na memória.
AMOR de uma vida não acaba com a morte.
Apenas toma outras formas, transforma.
Este é o único tempo que não finda, ao fim.
(... e estamos todos bem...)

Dani Altmayer





sexta-feira, 22 de novembro de 2013

Pontas Soltas- Fragmentos

                             Bons Tempos
Ela sentou do meu lado, na lotação. Tinha cheiro doce, cheiro de uva.
Senti saudade de um tempo em que o único medo que eu tinha era de engasgar com uma bala soft.
                                                          *******************
                            Nostalgia
Era um dia de vento e sol. O céu azul, de nuvens apressadas, me fez lembrar de uma estrada, por onde nunca passei. Engraçado. Dentro de mim vivem lembranças que não me pertencem.  Memórias de coisas que nunca aconteceram. Recordo, como se fosse hoje, o dia em que não te conheci. Sinto falta do beijo que não recebi. Da vida, que, não lembro. Vivi? E carrego comigo a dor de uma saudade que já não é minha. Uma saudade imensa, alheia.

                                   
             
                                                       ************************
                 
                           
                                                         Selva                                    
                          Tem gente que mata um leão por dia.
                      Tem gente que não. Eu, por exemplo.
                               Eu mato ilusão, todo dia.

                     
                                                    *********************
                                     
                                        Pedido        
                          ...e, quando o choro me cegar, e o chão me faltar.
                          Que eu siga o sol, que eu aprenda a voar.
                          Que eu ache um jeito.
                           Que eu saiba  rezar.



                                           *********************************

                                           P.S.
                                 Você. A cura, e a causa da minha insônia.

  Dani Altmayer
                             

quinta-feira, 21 de novembro de 2013

Vinte e Duas Horas.






Parece que quando a gente tem pressa, o tempo prega uma peça, se arrasta, pesado, em segundos que parecem minutos, e minutos que parecem horas. Ainda bem que acabou, agora é só fechar o caixa da Luisa, fechar a loja, e pronto. Começar a vida. Minha vida começa às dez horas da noite. Quando o shopping fecha.
Tenho que pegar o ônibus, e a Ana se arrumando. Se eu perder o de agora, só daqui a meia hora. Ela não sabe, não anda de ônibus, tem carro. Não sei como tem carro, com este salário de merda. Grande coisa, ser gerente desta joalheria. Ela se acha. Seu João deve dar um por fora, para ela. Já passei e repassei as contas, está sobrando 854 reais. Não consigo entender. A Ana vai me encher a paciência. Vou perder o ônibus.
Vou passar este caixa bem rápido, a Luisa nunca erra. Metódica, certinha, uma chata. Mas muito honesta, correta, confio nela. Boa funcionária. Preciso me apressar, ou vou perder meu cliente. Valter é de Curitiba, viaja à meia noite e meia. Combinamos uma rapidinha no hotel do aeroporto. Coisa básica, mas grana boa. Gente boa.
Não acredito que a Ana não percebeu que está sobrando dinheiro. Que gerente é esta? Se estivesse faltando, ela ia gritar. Também não sei, tá com a cabeça na lua. Muito estranha esta mulher. Bonitona, mas esquisita. Não sei o que seu João viu nela, pra dar tanta confiança.
Por que a Luisa está me olhando deste jeito, não consigo entender. Ela não tem como saber, lógico que não. Vamos logo com isso, fechar esta loja, tenho mais o que fazer, que o João não escute.
A Ana está com pressa. Tem dias que ela fica assim, sem paciência. Não consigo falar da sobra. O Vanderson quer tanto um videogame, prometi há mais de um ano. Ia dar certinho. E ainda sobrava para eu fazer minhas luzes, esta raíz tá uma coisa.
A Luisa está muito estranha, será que ela desconfia? Não pode ser, ninguém imagina.
A Ana desligou o computador, disse que está tudo certo, fechou. Deu boa noite. Falo, ou não falo? 
- Ana, tem uma coisa que preciso te dizer. 
- Luisa, estou morrendo de pressa. Você vai perder o seu ônibus. Outra hora a gente conversa.
 Falei que ela tá muito esquisita. Bom, azar dela. Ela que se entenda com o seu João, depois. Pego a minha bolsa, meto o envelope dentro. A Ana nem repara, tonta. Já está na porta, tomou banho de perfume. Corro até a parada.Bem a tempo.
Entro no carro, ainda tremendo. Preciso demitir a Luisa, não tem outro jeito. Mas como? O João não pode nem sonhar.
Amanhã penso em algo, indenização, uma grana extra. O João paga uma miséria para a coitada. Quem sabe compro o tal videogame para o filho dela, o Anderson? Valterson?  Nunca sei.
Bom, depois vejo isso. Agora é cuidar da minha vida. Que começa quando o shopping fecha. Às vinte e duas horas.

Dani Altmayer
Exercício Oficina Escrita Criativa MóduloII- troca de narrador. (bem confuso!)

terça-feira, 12 de novembro de 2013

À Deriva- Fragmentos

       
                 
         Mesmo lugar

Meu tempo é emprestado. E a trilha das pegadas que sigo sempre acaba no mar.

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          Não Tem Volta

   É tarde demais para quem atendeu ao canto da sereia.

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         Sufoco

Você por cima. Gemendo, suando. Resfolegando.
É como dia que tem que chover e não chove. (Pesado, úmido, abafado.)
Demorado.


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       Metáfora

 Tudo bem, então. Se não puder ser com você, que seja com alguém. Como você.

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      Pensamento

 Algo sempre dá errado. Ela planta brisa, mas só colhe tempestade.

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             Dani Altmayer

Exercício de mini ficção- Oficina de escrita Criativa Módulo II



segunda-feira, 11 de novembro de 2013

Aceitação

Jaime Goldberg photography

O tempo, que arrasta certezas, não é senhor das respostas.
(Ninguém é.)
Algumas perguntas nunca serão respondidas. Alguns silêncios não serão preenchidos.
Nem todas as dores serão curadas. Algumas só serão transferidas.
O tempo, ele passa sozinho. Como a gente.
Independente. Intolerante.
Indiferente, quase frio. Não adianta tentar segurar.
É da natureza do homem querer parar o tempo. Em vão. Esquece, não é coisa de se agarrar.
Tempo é mais do que sopro. É vento de primavera, não deixa nada no lugar.
Levanta as folhas mortas. Arranca o que está podre, o que não tem raíz.
Desmancha cabelos, e ninhos, sem maiores cuidados.
Em troca, traz e espalha presente. Outra semente, um novo grão.
Que germina ou padece. Que vinga, ou não.
Depende, do adubo e da vontade. Depende, da verdade e do chão.
O tempo é feito um passarinho.
Ele não perdoa. Voa.
Escapa pela mão.

 PS:  Então, tempo é para cuidar. O tempo que há.

Dani Altmayer 

sábado, 2 de novembro de 2013

O Som de Cada Um

Toda dor é solidão.
Lembro quando a minha mãe faleceu, há seis anos. Umas duas semanas depois, eu estava em uma daquelas festas de final de ano de empresa, fazendo um esforço extra humano para me distrair. Em uma conversa com colegas, uma falou: "nossa, como você está bem, né? Nem parece que acabou de acontecer".
Sério?
Alguém se foi. Algo se perdeu. Ele adoeceu, ou morreu. Ela te deixou.Você se separou. Sua vida partiu, desmoronou.
E ninguém diz.
Você sai na rua, e tudo está tão igual. As pessoas riem, e brigam, e andam. E falam, o tempo todo.
Tem gente esperando o ônibus, pegando táxi. Mais adiante um casal se beija. O chip do celular é anunciado, aos gritos. Conversas entreouvidas, entrecortadas, uma música alta na loja de roupas. Faz barulho, lá fora. Os sons atravessam seus ouvidos sem fazer sentido. Estilhaços.
É verão, o sol brilha forte, e ofusca seus olhos, escondidos em óculos escuros, enormes. Olhos que ardem, de lágrimas residentes, pendentes.
Da vida que segue, ela também pendente, sem saber para onde.
Você vai ao supermercado, faz compras, corta o cabelo. Toma banho, se perfuma. Come, e dorme. Acorda. Trabalha. Até fala. Sorri. Vai a festas, enfim.
E ninguém diz.
Você quer parar o mundo, mas o mundo não para. Logo mais é Natal.
Você quer o mundo em silêncio, para fazer par com o abismo que está dentro de você. Mas o mundo não cala.
Você está tonto, e o mundo gira. Você segura firme, mas ele roda, rodopia.
Dá voltas, te exige. Em círculos, sempre os ciclos. O circo continua.
Está faltando uma metade, um pedaço, uma perna, um abraço. Abraço também é pedaço.
Mas ninguém vê. Ninguém diz, assim, só de olhar para você.
Não podem saber, não ao certo.
É que ninguém sabe da dor que não a sua.
E ela tem um ritmo só dela. Só seu. Bate de um jeito, dentro de cada peito. 
Toda dor é silenciosa e íntima. Mesmo quando gritada, é profunda.
Uma dor é sempre secreta, ainda que compartilhada.
E não menos real, por não ser dividida. Por estar escondida.
A dor cala somente a alma de quem a sente. Cala só.
Toda dor é única, pessoal e intransferível. Impressão digital.


Dani Altmayer



sexta-feira, 1 de novembro de 2013

Outro Sonho

É um sonho. Estou sonhando, e sei que é um sonho.
Não faz mal, estou feliz, mesmo sabendo.
Você está no meu sonho. Faz tempo que não te vejo. Nem em sonhos.
É um sonho confuso, como são os sonhos.
Tem tanta gente no sonho, gente demais. Mas tem você.
Por mim, bastaria você, no meu sonho.
Se eu pudesse mandar nos sonhos, mandaria todo mundo embora. Esvaziaria o sonho, reduziria. Deixaria bem simples.
No meu sonho só caberia você. E eu. O básico.
Não posso, no entanto. Não se controla sonhos, que pena.
Então, é mais ou menos assim, este sonho: eu, você, um monte de gente no meio. Um pouco confuso.
Você  me vê, sorri para mim, entre as gentes. Entre tantos.
Aproxima-se, e entrega, escondido, um papel amassado. É importante, você diz, em segredo.
Guardo no bolso, com muito cuidado, o coração disparando. Para ler depois.
Quero muito ler, mas deixo para depois.
A gente sempre guarda para depois o que é importante.
Um depois que nunca vem.
Acordo antes.

Dani Altmayer  

"O seu amor, a sua ternura, eram apenas um sonho. Mas valeria a pena aceitar sonhar um amor que queremos viver na realidade?"
Simone de Beauvoir