terça-feira, 17 de junho de 2014

Poesia na Esquina

Tem sempre alguma gente acontecendo em alguma esquina.
Tem gente vendendo, tem gente comprando.
Tem gente atravessando, tem gente esperando. Tem gente decidindo, esquerda, direita. Tem gente indecisa.
Tem gente parada. Tem gente que sempre buzina.
Tem gente fazendo ponto, e tem gente bailarina.
Tem sempre alguém fazendo alguma coisa em alguma esquina.
Na esquina da Osvaldo Aranha com a Redenção, por exemplo, tem um homem.
O homem usa o cabelo preso em um rabo de cavalo. Ele veste um casaco cinza, como o céu de Porto Alegre. O céu, que também veste triste nestes dias de junho cinza.
Não consigo ver o rosto do homem, se é velho ou moço. Passo longe, e espio. De dentro do ônibus, eu e a menina. Vemos o homem de cinza, na esquina.
Ele é equilibrista.
Esta gente esquisita, que é meio homem, meio artista.
Ele equilibra um violão. Vermelho.
Ele equilibra um violão vermelho. Com o queixo.
Ele equilibra um violão vermelho com o queixo. Na esquina.
Não usa as mãos, que estão penduradas junto ao corpo. Estão escondidas, pelas mangas enormes de seu casaco cinza, e disforme.
Ele equilibra um violão. Vermelho. Com o queixo. Apenas.
Ele equilibra. Apenas. Com o queixo. Um violão. Vermelho.
Na esquina.
Não sei se é moço, ou velho. Sei que está só. Como eu, e a menina.
Como toda esta gente, na esquina.
E usa um rabo de cavalo, e veste um casaco cinza.
E equilibra seu violão vermelho, com o queixo.
É um equilibrista, de paletó.
Cinza, como o céu do inverno que se aproxima.
Triste como os olhos da passageira, e também da menina.
Como a cidade, de cimento armado.
É tudo cinza nestes dias de junho. Nesta Porto Alegre triste.
Até ele.
Mas é vermelho seu violão. E brilha.
Seu violão é vermelho, como seria o sol. Se houvesse.
Seu violão é um sorriso vermelho. Equilibrado.
No queixo de um artista. Numa esquina.
Cheia de gente de casaco cinza e solidão.
Porque tem sempre alguma solidão acontecendo em alguma esquina.



Dani Altmayer  ( o desenho também :P )

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