quarta-feira, 14 de maio de 2014

A Vendedora

Daiane tem 23 anos. Loira, bem arrumada, unhas pintadas de azul.
Chega para fazer um exame admissional. Pergunto onde trabalhava antes, ela responde: "na funerária X." Função? "Vendedora."
Vendia planos de funeral.
Ficou nove meses na empresa. Conta que só uma vez não bateu a meta de vendas.
A meta era atingir vinte planos por mês, no mínimo. Fala que, de cada cem, cento e cinquenta ligações, vendia um. Quando realizava a venda, o primeiro pagamento devia ser feito no ato. Mandava o motoboy imediatamente para a casa do comprador. "Tinha que ser na hora, doutora. Se esperasse um dia, o cliente desistia."
Quanto custa este plano? Cinquenta reais por mês, não é caro. E a carência é de um semestre. Depois disso, já pode morrer. Com cobertura total.
Nove meses, vendendo vela e caixão. Gaveta ou cremação.
Começou a ter pesadelos. Outro dia quase desmaiou, achou que estava tendo um derrame, o corpo todo formigando. Era stress. Psicológico.
"Sou muito nova, doutora, para falar de morte o dia inteiro. Pedi demissão."
Questiono sobre a nova função. Ela abre um sorriso enorme, e declara, orgulhosa:
"Agora vou trabalhar numa loja, no shopping. Vender lençóis de algodão egípcio. São lindos. Aparece por lá."
Deixa um cartão.
E um perfume gostoso no ar.

Dani Altmayer



2 comentários:

  1. Que linda história! Gostoso de ler, de imaginar.

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  2. Perfeito Dani! Só mesmo vendendo lençóis egípcios, para dissipar qualquer passado....

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