quinta-feira, 21 de novembro de 2013

Vinte e Duas Horas.






Parece que quando a gente tem pressa, o tempo prega uma peça, se arrasta, pesado, em segundos que parecem minutos, e minutos que parecem horas. Ainda bem que acabou, agora é só fechar o caixa da Luisa, fechar a loja, e pronto. Começar a vida. Minha vida começa às dez horas da noite. Quando o shopping fecha.
Tenho que pegar o ônibus, e a Ana se arrumando. Se eu perder o de agora, só daqui a meia hora. Ela não sabe, não anda de ônibus, tem carro. Não sei como tem carro, com este salário de merda. Grande coisa, ser gerente desta joalheria. Ela se acha. Seu João deve dar um por fora, para ela. Já passei e repassei as contas, está sobrando 854 reais. Não consigo entender. A Ana vai me encher a paciência. Vou perder o ônibus.
Vou passar este caixa bem rápido, a Luisa nunca erra. Metódica, certinha, uma chata. Mas muito honesta, correta, confio nela. Boa funcionária. Preciso me apressar, ou vou perder meu cliente. Valter é de Curitiba, viaja à meia noite e meia. Combinamos uma rapidinha no hotel do aeroporto. Coisa básica, mas grana boa. Gente boa.
Não acredito que a Ana não percebeu que está sobrando dinheiro. Que gerente é esta? Se estivesse faltando, ela ia gritar. Também não sei, tá com a cabeça na lua. Muito estranha esta mulher. Bonitona, mas esquisita. Não sei o que seu João viu nela, pra dar tanta confiança.
Por que a Luisa está me olhando deste jeito, não consigo entender. Ela não tem como saber, lógico que não. Vamos logo com isso, fechar esta loja, tenho mais o que fazer, que o João não escute.
A Ana está com pressa. Tem dias que ela fica assim, sem paciência. Não consigo falar da sobra. O Vanderson quer tanto um videogame, prometi há mais de um ano. Ia dar certinho. E ainda sobrava para eu fazer minhas luzes, esta raíz tá uma coisa.
A Luisa está muito estranha, será que ela desconfia? Não pode ser, ninguém imagina.
A Ana desligou o computador, disse que está tudo certo, fechou. Deu boa noite. Falo, ou não falo? 
- Ana, tem uma coisa que preciso te dizer. 
- Luisa, estou morrendo de pressa. Você vai perder o seu ônibus. Outra hora a gente conversa.
 Falei que ela tá muito esquisita. Bom, azar dela. Ela que se entenda com o seu João, depois. Pego a minha bolsa, meto o envelope dentro. A Ana nem repara, tonta. Já está na porta, tomou banho de perfume. Corro até a parada.Bem a tempo.
Entro no carro, ainda tremendo. Preciso demitir a Luisa, não tem outro jeito. Mas como? O João não pode nem sonhar.
Amanhã penso em algo, indenização, uma grana extra. O João paga uma miséria para a coitada. Quem sabe compro o tal videogame para o filho dela, o Anderson? Valterson?  Nunca sei.
Bom, depois vejo isso. Agora é cuidar da minha vida. Que começa quando o shopping fecha. Às vinte e duas horas.

Dani Altmayer
Exercício Oficina Escrita Criativa MóduloII- troca de narrador. (bem confuso!)

2 comentários:

  1. Este texto exige atenção, releitura, para entender quem fala o quê. Li várias vezes. Gostei da história. Não é um texto simples, mas tem um bom desenvolvimento. Porém, sou suspeita, sou tua fã de carteirinha. Hi.Hi.

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  2. Obrigada amiga querida! Valeu o exercício, tudo é aprendizado.

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