quinta-feira, 3 de outubro de 2013

Vamos Combinar: Se eu não te vejo, você não existe .



Quando o parque de diversões chegava na cidade, era uma festa. Roda gigante, cinema 360 graus ( grande inovação tecnológica dos anos 70), maçã do amor, e a atração principal: o trem fantasma. Eu era pequena, e morria de medo, mas nunca deixava de ir. O melhor de todos os brinquedos. Tinha sempre fila para o frio na barriga, a gente vibrava na antecipação do susto.
Todas as vezes, sem falhar nenhuma, eu ia de olhos fechados. Do início ao fim. Todas a vezes, durante todo o percurso, sempre mesmo. Tenho que confessar que nunca, em todos aqueles anos, eu abri meus olhos no túnel. Nem para dar uma espiadinha. Mas gritava o tempo todo, e saía sempre apavorada.
Tudo o que eu tinha eram algumas sensações. Teias de aranha, gritos horrorosos, clarões de luz. E, claro, a minha fértil imaginação. Nada mais do que isso.
Outro dia, conversando sobre o assunto, cheguei a uma conclusão óbvia, embora um tanto tardia: o medo só era possível de olhos fechados. Provavelmente, se eu decidisse abri-los, a surpresa seria o riso, ao invés do susto. Com certeza, nenhum monstro, naquele parque meio falido, naquela cidade pequena, chegaria aos pés daqueles que só eu conhecia. Que só existiam dentro da minha cabeça, frutos da minha própria criação. Afinal, o escuro desaparece quando a luz se acende, né? Nenhum monstro resiste a uma boa encarada.
Quantas e tantas vezes, bem mais tarde, mas ainda feito aquela criança, fechei os meus olhos por covardia. Por não querer enxergar. Ainda hoje faço isso. Nunca funcionou, nem vai, e acho que sei o porquê.  
Como naquele trem, a vida que levamos de olhos fechados é a única capaz de meter medo de verdade. 

Dani Altmayer

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