segunda-feira, 18 de março de 2013

No começo, no meio e no fim

"No começo era tudo maravilhoso. Ele era um amor, super atencioso..." Daí em diante me distanciei, e não ouvi mais a conversa das duas amigas que caminhavam no parque . Mas consigo imaginar o final desta história. Infelizmente. Qualquer um consegue.
Todos os começos são maravilhosos. Sempre.Sejam eles do que for. Um novo trabalho, um relacionamento, um curso. Todos os começos trazem em si um mundo de novas possibilidades. São como cadernos em branco. Todo começo é como início de ano letivo. Material novo em folha, estojo organizado. Canetinhas, lápis, apontadores. De todas as cores. Livros, sem dobras. Cadernos, sem rasuras. Páginas e páginas, a serem preenchidas, do jeito que a gente quiser. E a gente sempre começa com capricho. Tomando cuidado para que nada se perca. Prezando cada item. Valorizando cada pequena coisa. Se esmerando para escrever de forma legível. Sublinhando de cor de rosa cada frase importante. Colando adesivos e bobagens para enfeitar. No começo a gente sempre presta atenção. Muita atenção. No começo a gente quer tudo bonito. Faz promessa, desta vez vai ser diferente. No começo a gente está aberto. Em branco, como nossos cadernos.
Com o tempo, a gente vai relaxando. Deixa de cuidar tanto. Perde uma caneta aqui, uma borracha ali. Risca a palavra, escreve por cima. Arrisca um garrancho. Borra o desenho, esquece o dever. Fica desatento, inquieto, entediado. Acha que já sabe tudo, que conhece bem. Lê o livro, erra a interpretação. Joga o jogo da velha e o jogo da forca, rabisca muito, responde menos, faz pouco caso. Com o tempo, vamos ficando desmotivados. Achamos que a aprovação está garantida, que já passamos. Na ausência de novos estímulos, perdemos o interesse. No caderno, usado, e quase completo, já não há espaço para uma história diferente. O livro, lido e relido, está cheio de orelhas. A fórmula, decorada à exaustão, ninguém entendeu.
O tempo gasta a gente. As coisas da gente. O tempo acomoda. Perde. Concede demais. O tempo descuida a gente. E a gente descuida com o tempo. Guarda pontas e decepções como fossem coleção. Esquece a regra, a cartilha, perde o mapa. Não perdoa erro. Não perdoa a perda.
A gente gosta de começos. Começos são promessas. A gente gosta de promessa. Gosta de probabilidade. Gosta de tudo novo, bonito, por vir. A gente cuida, no princípio. É atencioso, no início. A gente sempre capricha no começo.
No meio a gente põe o abrigo e o chinelo. Sai na rua sem pentear o cabelo. Não presta mais atenção. Fala alto, e muito. Para de ouvir. Relaxa na familiaridade. Relaxa demais. Esquece de dar manutenção, de repor aquela borracha aqui, aquela caneta ali. De fazer um remendo acolá. De apagar passados. De rever importâncias. reler textos. De revisar contextos. De levar a maçã.
A verdade é que, no meio, a gente desenha o fim.
A gente gosta de novidade, e tudo bem gostar. Se somos almas inquietas, curiosas. Seres desejantes. O novo fascina, encanta, atiça. Só que o novo é todo dia. Todo novo dia é também um novo caderno. Uma nova aula. Um bloco de notas, pronto para ser escrito. Ou reescrito. Uma nova edição do velho texto conhecido. Ou um texto novinho em folha. Uma primeira edição. Todo novo dia é uma nova chance. De fazer o mesmo, só que diferente. Ou de fazer diferente, mesmo. Depende.
Dá para começar de novo, todo dia. Ou começar totalmente novo. E desta vez, caprichar. Caprichar todo dia. Caprichar por todo o tempo. Assim como no princípio, agora. E fim.

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