sexta-feira, 18 de janeiro de 2013

Amour

Sexta feira de verão em Porto Alegre, final de tarde. Cidade vazia, decidi ir ao cinema. Sozinha. Não fazia isso há alguns anos. Antes, dei uma passada na livraria, e quase perdi o horário do filme. Comprei mais um livro para se juntar à pilha na minha cabeceira, que, aliás, está enorme. Já não leio na velocidade e intensidade com que costumava fazer. Mas gosto de saber que eles estão ali, à minha espreita. Coisas que só quem ama ler pode entender.
O filme ao qual assisti se chama Amor ( Amour), um filme de língua francesa, dirigido por um austríaco,  mostra um casal de idosos de seus 80 anos, professores de música aposentados, que tem uma filha que mora em Londres. A mulher, Anne, sofre um acidente vascular cerebral (derrame), e o filme se desenrola a partir daí. Uma bela crônica sobre a velhice, as limitações de uma doença incapacitante, e, sobretudo, como o próprio nome diz, uma bela crônica sobre o amor. Os cuidados que o marido ( Georges) dispensa à esposa enferma, lavando seu cabelo, trocando suas fraldas, dando de comer e contando histórias, sem questionar por um momento a necessidade de assim agir, sem demonstrar impaciência ou falta de respeito, mostram um amor desvelado por aquela que foi sua companheira de uma vida. Sem dramas, com uma firme aceitação do destino a se cumprir, o filme emociona, e cala fundo. Deixa um questionamento, e mostra um contraste entre as relações superficiais de hoje ( como o casamento da própria filha), e as relações de outrora. Ou entre as relações baseadas em amor de verdade e as que se baseiam em interesses outros. Sei lá. A sessão acaba em um silêncio constrangido, perturbado, comovido. Engolido a seco.
O fato interessante é que fui assistir ao filme em um shopping e em um horário caracterizados pela grande quantidade de idosos nos seus cinemas. E eles estavam lá, muitos deles, alguns de bengala, outros de cabelo bem branco, sozinhos, ou com seus pares, algumas senhoras em grupo. Na saída entreouvi comentários, nossa, que filme pesado. Para quem tem esta realidade tão próxima de si, sim, acho que é um filme bem pesado. Pesa a idade, a solidão, e a doença. O fim.Tudo isso pesa.
Mas o filme também nos faz lembrar que toda a carga, não importa o peso, o tamanho, a forma, se torna mais leve ao ser dividida. Nos faz lembrar que o essencial está nos pequenos gestos. Que o que fica não é o que se aparenta, e sim o que se mostra como verdade. Sem subterfúgios, e sem atalhos. Não há atalhos na vida.Nos faz compreender que a medida do amor é amar sem medidas. Que  amor é isso. O resto não é amor. Não sei o que é, é outra coisa, só que amor não é.

6 comentários:

  1. lindo texto sobre o filme. Tive a mesma impressão sobre o amor, mas um amigo fixou completamente no tema morte, chegando até a mencionar a palavra assassinato, o que me fez pensar que as interpretações sobre o mesmo vivido são tão particulares ao momento vivido e que a percepção do amor é maior entre aqueles que ou estão vivendo no momento ou acabam de viver. Pra entender de amor, só amando mesmo.

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  2. Dani.
    Fiquei comovido com tuas palavras. Ainda não vi o filme, pois atravesso um momento difícil de vida e estou super sensível. Sei da importancia de sua mensagem. Concordo com voce em todos os sentidos. Sei o que vou ver, por isso já me antecipo escrevendo a voce aqui. Fico contente que Susan tenha postado teu comentário.
    Grande beijo.
    Pedro Paulo (PP)
    PS: como diz bem Guigo, ...para entender de amor só amando....

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  3. Obrigada Pedro Paulo, pelas tuas palavras.É um belo filme, mas seco, e forte, realmente.Tem que estar preparado. Mas toca na alma, espero que aprecies. Beijão

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  4. Poderia te sugerir uma outra obra-prima que também reinventa a vida enquanto geronte. Trata-se de Elsa & Fred - Um amor de paixão. Em lingua espanhola, mais uma vez um argentino mostra toda sua sensibilidade em tratar desse tema, tão "espinhoso" - a decripitude do envelhecer. Lembra A Doce Vida, onde Anita Ekberg encontra Marcello Mastroianne na Fontana Di Trevi. Obrigado pela dica, vou tentar ver Amour, Ao término como dissestes, a garganta está seca e a mente inundada de pensamentos. Mesmo assim a vida deve continuar sempre doce. Bj Dani

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  5. Marcos, eu assiti a Elsa e Fred há alguns anos...maravilhoso! Mostra também como o amor não tem idade, não tem hora para acontecer.E eu simplesmente adoro os filmes argentinos! A Doce Vida nunca vi...falha minha!Como geriatra, te recomendo Amor, quando puderes, assiste.Vai te tocar muito... Beijo

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  6. Ops, você, enquanto geriatra. Não eu...bj

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