terça-feira, 7 de setembro de 2021

Seis de setembro

 




Isso é novo, essa dor.

Chegou de repente, sem bater na porta, depois do café da manhã. As dores que chegam de manhã são sempre mais perigosas.
Invadiu o banheiro enquanto penteava os cabelos, logo depois de escovar os dentes e passar um creme no rosto.
É preciso proteger sempre o rosto. Todo dia, ao acordar e antes de dormir, duas ou três gotas de ilusão vendida em potes. É preciso se cuidar o tempo todo- do sol, das rugas, dos descalabros. Do tempo.
E das ilusões.
A nova dor chegou segundos antes do rímel, e foi a sorte, evitando, com seu timing preciso, que as lágrimas corressem escuras e escandalosas.
Foram sim, caudalosas, mas discretas, cristalinas e quentes como devem ser as lágrimas de bem. Decentes. Facilmente laváveis.
Ela (a dor) veio como quem chega do nada, mas já com ares de quem está pensando em fixar terreno, construir um puxadinho, se abancar naquele lugar onde as dores desse tipo gostam de fazer morada.
Entre a garganta e o osso do peito, onde sobrevivem de aperto, de roubar o ar e o alimento, de tirar apetites, arrancar suspiros, de disparar os corações cansados, a torto e a direito.
Vivem (as dores essas) de transbordar os copos, qualquer gota d'água no acumulado de mágoa, na exaustão da esperança, da utopia que luta, trabalha, que busca sentido em qualquer sentir, depois dorme ao sol se pôr.
E se refaz em madrugadas lentas, nos sonhos turbulentos, para renascer no outro dia, seis horas da manhã.
Para, no instante de escovar os dentes, pouco antes, pouco depois, grudar na cara feito blush, rímel e pó de arroz. E só então sair porta afora, na fantasia um pouco comovente e um tanto patética, da mulher forte, inquebrável, guerreira.
A esperança é a armadura, a maquiagem e a máscara de quem não quer (nem pode) desistir. Só que às vezes, a esperança não acorda, não.
Deixa os frascos vazios, ausente, deixa um vácuo. Mas os vácuos não existem.

Aí vem essa dor nova, com ares de temporal.
E chove.

Nenhum comentário:

Postar um comentário