sábado, 16 de abril de 2016

Contrato em branco



Ele vem para um exame admissional como porteiro, e pergunto por quanto tempo ficou na última empresa onde trabalhou como eletricista.  Responde com certa irritação:
- Seis meses, até terminar a obra. Era um emprego temporário, mas eles não avisaram. Se eu soubesse, não tinha nem pegado, eu gosto de trabalhar com elétrica, mas não gosto de temporários.
Ele sai da sala mas a frase fica: não gosto de temporários.
Ninguém gosta, eu acho. Porque a necessidade de garantia vem da da fome de certezas que decorre, por sua vez, da única certeza que temos. Que nosso tempo é provisório.
O tempo, esse velho senhor passageiro, misterioso e indecifrável, nunca dá garantias. Se o tivessem avisado, que diferença faria?  O que é pior, estar desempregado ou trabalhar por um tempo no que se gosta? O que é melhor, ficar na segurança de uma zona morna, triste conhecida, ou viver uma paixão desenfreada de dias contados e choro garantido?
Não sei de suas dúvidas, mas sei de mim. Não quero que a incerteza me limite. Quero aceitar os riscos e os desvios, os desvarios e as súbitas mudanças de direção. Quero viver a cada dia, mesmo sabendo que um dia irão terminar. Seja um trabalho, uma viagem, uma alegria, uma mágoa profunda. Nada é certo, ou permanente. É tudo ciclo, são ciclos.
Porque tudo nos é emprestado, a juventude, a infância de nossos filhos, até os sonhos. Um amor que dura uma estação ou uma vida inteira, ainda assim é temporário.
Nada nosso é eterno. Muito menos a vida, que não é mais do que uma caixa de surpresas a nós concedida pelo senhor tempo, dentro de um espaço finito, limitado. Um presente absurdo (de bom), e deveras inconstante. Essa vida louca, que, como disse Guimarães Rosa, (só) exige da gente a coragem.

Dani Altmayer

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