segunda-feira, 6 de outubro de 2014

Chá das Cinco e uma outra história.

                                     


                                  Chá das Cinco

- Minha filha quer contratar um jardineiro para cortar a grama. Disse que paga.
Era um final de tarde, e estavam as três tomando chá na varanda dos fundos, aproveitando o clima ameno do início da primavera. O jardim, comprido e estreito, que um dia fora o orgulho das irmãs, estava mesmo com ares de abandonado. Fora um longo e úmido inverno. Apesar das rosas já terem florescido, o capim estava alto e vários arbustos de ervas daninhas haviam brotado ao longo do quintal.
Havia chovido mais cedo, e um cheiro de terra molhada misturava-se com o perfume doce das senhoras e ao cheiro do bolo recém saído do forno.
Uma súbita brisa as faz estremecer, e apertar os casacos junto ao corpo. Ainda está frio para ficar na rua a esta hora.
- Estamos velhas demais para um jardim. Talvez fosse melhor mandar cimentar o pátio.



                                                    O Visitante
                                                 

João força a fechadura, e entra na casa com a tranquilidade  que só um hábito pode trazer. "Qualquer dia elas vão me servir café", pensa, e sorri. Olha ao redor e percebe mais uma vez o capricho nos detalhes, a limpeza extrema, o cheiro de biscoitos de ervas assados no forno. Sempre tem este cheiro, ali. Mesmo que elas não tenham assado biscoito nenhum. Pelo menos não tem cheiro de mofo, como na casa da tia dele.
O gato branco está na estante, como sempre, os pêlos ouriçados, dentes arreganhados. João não gosta de gatos, são traiçoeiros. Mas este está tão velho que não lhe mete medo.
Não tem mais ninguém em casa. Ele prefere assim, por isso escolhe a hora da feira, ou da missa. Nem sempre tem sorte, às vezes uma delas está doente, ou cansada.
Faz tanto tempo, que ele até sente um certo carinho pelas três irmãs. Tem um pouco de pena delas, bem se vê que a família não liga muito. Só que não é problema dele, o problema dele é outro. Tem que achar o esconderijo da vez.
Senta um pouco no sofá puído, e olha ao redor. "Por que velho gosta tanto de caixa e porta retrato? "
Estende o braço e abre uma caixinha de música, que começa a tocar. Põe a bailarina para girar. Há muito não tem jóia nenhuma ali. Ele gosta da música. Distraído pelo som da valsa, não percebe os passos atrás de si.
De repente, sente algo gelado e duro encostando no seu pescoço.





Dani Altmayer

PS Exercício sobre finais, para a oficina de escrita. Mote:
"Três velhinhas viviam sozinhas em uma casa de periferia, e eram constantemente atacadas por um ladrão. Até que uma delas consegue um revólver e mata o assaltante. Não chamam a polícia, e o enterram no quintal."
Primeiro final- fechado
Segundo final- aberto

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