quarta-feira, 7 de novembro de 2012

Delicado equilíbrio

  Todos os dias, bem cedinho, no meu trajeto para o trabalho, eu os vejo. Mãe e filho em uma bicicleta. Ela gordinha, na direção. Ele, magrinho, na carona. A mochila da escola  vai no cesto da bicicleta. Vão pela calçada, o que é prudente. Porto Alegre é uma cidade hostil aos ciclistas. A avenida Osvaldo Aranha, que até já teve um projeto de ciclovia, é, neste horário bem cedo, uma via expressa de motoristas. Motorizados e com pressa. Muita pressa.
  Todos os dias eu os vejo. Ela gordinha, ele magrinho, uns 8 anos de idade. Presumo que sejam mãe e filho. Conto esta cena, porque me intriga um fato. Só ele está de capacete. Ela não. Ele sempre. Ela nunca. Por quê?Se eles caírem, não vão se machucar, os dois? A cabeça dele é mais importante do que a dela? Presumo que sim, do ponto de vista da mãe, ao menos. Digo isso sem nenhuma crítica, apenas constatando, sou mãe e também ajo assim, muitas vezes.
  Todos os dias eu os vejo, e penso a mesma coisa: por quê? E me vem à memória as instruções de segurança dos aviões: em casos de despressurização, máscaras cairão automaticamente sobre a sua cabeça. Se estiver viajando com criança, coloque primeiro a sua, depois a dela. Mais ou menos assim. Ou seja, você tem que estar a salvo para poder salvar outra pessoa. É isso.
  É isso, e é simples. Mas não sei se por uma questão cultural, ou intrínseca mesmo, pelo tal instinto, nós mulheres tendemos a nos esquecer disso. E não falo só em relação aos filhos, apesar de principalmente. Na maioria de nossos relacionamentos agimos desta forma. Protegendo e cuidando do outro, e nos deixando de lado. Priorizando e valorizando o outro, em detrimento, muitas vezes, de nossos sonhos e desejos. Em detrimento de nossa própria segurança, física e até mesmo emocional. De que serventia podemos ser, se estivermos todas estropiadas, e machucadas? Esquecemos que, para cuidar, proteger, e alimentar o outro, seja ele quem for, precisamos estar antes cuidadas, protegidas e alimentadas. Saudáveis. Em todos os sentidos. Só podemos dar aquilo que temos. Mas e se dermos mais do que temos? Bom, apesar da matemática não ser o meu forte,  até eu sei esta resposta: o saldo vai ser negativo.
  Olho para aqueles dois na calçada, de bicicleta, todos os dias. Todos os dias desejo que construam uma ciclovia. Várias. Que transformem esta cidade em uma cidade pedalável.  E todos os dias peço, em silêncio, para aquela mãe: coloca um capacete, também, vai. Te cuida aí. Pode ser que você não saiba, mas a sua cabeça é importante. Tão importante quanto a dele. Autoproteção não é egoísmo. É equilíbrio. Indispensável para andar na bicicleta. E para andar na vida,  fundamental.

Nenhum comentário:

Postar um comentário