quinta-feira, 22 de novembro de 2012

Como cães e gatos


    Há duas noites, minha gatinha caiu da janela, e fugiu. Não foi a primeira vez, já fez isso antes.Na noite passada, ela voltou. Acordei de madrugada, com o miado forte, vesti uma roupa, enchi o pote de comida e desci. Sentei no chão, na frente da porta do meu prédio e chamei baixinho. Ela estava dentro de uma floreira sem flores, e ficou me espiando. Aparecia e desaparecia, brincando de esconde esconde. Eu, imóvel, esperava. Demorou uns bons dez minutos para ela vir se aproximando, cautelosa, e concluir que poderia voltar a confiar em mim. Chegou por trás, e se esfregou na minha perna, como os gatos costumam fazer quando querem carinho. Com todo o cuidado do mundo, eu a peguei no colo, falando baixinho para não assustá-la e a trouxe de volta para casa. No apartamento, meu cachorrinho a saudou, entre latidos e lambidas, e, em poucos instantes, o caos familiar voltou a funcionar. Detalhe para o horário: 4 horas da manhã. 
       Hoje, lembrando do "resgate", pensei que algumas pessoas são assim, como os gatos. É necessário muita cautela e paciência para que, finalmente, deixem chegar perto, estejam feridos ou não. Gente desconfiada. Que obedece a critérios próprios para classificar quem é e quem não é digno de seu amor. E, mesmo depois disso decidido, ainda é preciso muito cuidado. Qualquer gesto mais brusco, ou palavra dita fora de hora, podem botar tudo a perder. Nenhuma conquista é eterna aqui. 

        Já outras pessoas são mais parecidas com os cachorros, em relação a afeto e fidelidade. Tendem a confiar  logo de cara, demoram para se decepcionar ( se é que isso acontece), e distribuem seu amor de forma generosa e um pouco atrapalhada. Abanam o rabo para o primeiro que lhes fizer um cafuné, pulam na perna de qualquer um, e o seguem com adoração por todos os cantos da casa. São, de certa forma, ingênuos na sua alegria e doação desmedidas. Insistentes e, muitas vezes, chatos na sua carência. Toda atenção pode ser pouco, aqui.  

       Tenho os dois em casa: uma gata e um cachorro. Convivem em harmonia, apesar de todas as diferenças. Ou até por causa delas., mostrando que ser diferente não é empecilho para nenhum relacionamento. Desde que haja respeito mútuo, um pode aprender muito com o outro. O cachorro pode aprender com o gato, muito além de subir nas mesas, a ser mais independente. A respeitar o espaço alheio. A não sair assim, dando seu amor para qualquer um, sem uma mínima análise prévia. A ser um pouco misterioso e se valorizar. Já o gato também pode aprender com o cachorro, muito além de brincar de bolinha, a ser mais generoso no seu afeto. A ser mais alegre, e menos desconfiado. A não se levar tão a sério. Analisar sim, mas também correr riscos, porque de riscos é feita a vida. De riscos são feitas as relações, e também de confiança. Não há garantias, nunca, e aí que está a graça. Que aprendam o significado e o valor da fidelidade. Que possam acreditar que, por mais dura e adversa que seja uma situação, sempre vai ter alguém disposto a um resgate. Numa madrugada  qualquer, de um dia qualquer. Por um motivo bem simples: por amor.

Dani Altmayer

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