segunda-feira, 21 de março de 2016

Salgada agonia

Cassino- RS foto Dani Altmayer

Ele tinha cheiro de maresia e olhos de por do sol.
Toda vez que se tocavam, uma solidão absurda a engolia. 
Como na praia da sua infância, um canto de gaivota atravessando o silêncio de uma tarde fria.
Pássaros bailavam em bandos formando desenhos estranhos no céu de nuvens altas.
E o corpo antigo de uma tartaruga gigante em decomposição se misturando às gotas de sal, lembrava da morte.
O vento assobiando em seus cabelos embaralhava as promessas confusas da ultima vez.
Nas dunas sopravam as mentiras desertas, fininhas, que doíam ao bater nas pernas nuas e faziam trincar os dentes num arremedo de abraço.
Num cansaço de pescador sem mulher sem rede sem barco.
O mar de ressaca e uma garrafa de vinho tinto, a desordem da espuma branca, a água gelada escura.
Funda de redemoinhos e bancos arriscados sem crédito nem fim.
A areia dura como sua boca sem sorrisos, uma espiga de milho seca, e o vento. Sempre o vento.
Cortante e impiedoso como o tempo.
Cantando aquela música aguda sem melodia, num assobio vazio e triste, quase um lamento.
Ondas sem nexo, quebrando em pedaços as conchinhas brancas na beira.
Esse tormento, o jeito dele mexer com ela, de a quebrar inteira e depois deixar à deriva os cacos.
Batendo nas pedras moles, nos molhes a vagar, vagoneta sem velas. 
Esperando um navio que viria de longe, do norte, sei lá de onde.
Um navio bem grande que passou bem rente. E nunca aportou.

Dani Altmayer
Cassini RS foto Dani Altmayer

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