sexta-feira, 9 de janeiro de 2015

Nossos jardins



Quando eu era criança, tinha alguns livros prediletos, que costumava ler diversas vezes. Naquela época ainda era possível terminar um livro, e começar outro, e mais outro, e como não havia essa grande oferta de literatura infantil, acabava repetindo muitos. Minha mãe dizia que eu não lia, e sim, devorava as histórias. Ficava louca comigo.
Hoje lembrei de um destes livros que fizeram parte da minha infância.
"O Jardim Secreto", que, segundo uma rápida pesquisa, é um clássico da literatura inglesa. Na época eu não sabia. Mas me encantava a história daquelas três crianças solitárias, que partilhavam um segredo. A menina orfâ, seu amigo e o pobre primo rico, que encontraram naquele lugar um refúgio da sua solidão. 
Faz muito tempo que deixei para trás a minha menina tímida e introspectiva, que comia livros em vez de comida.
Não lembro de detalhes da história. Lembro apenas do jardim, de suas flores exuberantes e raras, um lugar latente e cheio de vida. Um jardim que curava as dores mais diversas.
Os livros eram então, o meu jardim secreto.
Hoje tenho outros jardins, também secretos. 
São lugares escondidos e muitas vezes com cadeado enferrujado, difíceis até de encontrar, no labirinto dessa vida maluca e cinzenta. Mas são meus pequenos oásis de luz e de sol.
É para lá que vou quando estou muito triste.
Refugio-me na sombra de memórias, afetos e músicas. E dos livros, ainda. 
Na sombra das coisas que me alimentam a alma, e me fazem lembrar que assim é o ciclo. Nascer, crescer, e morrer. Frutificar e florescer. E então fenecer. Para, mais uma vez, ser semente e recomeçar. No fluxo, no jardim dessa vida, a chance de novamente desabrochar.
Acho que todo mundo tem, ou deveria ter, um jardim assim secreto. Que pode ser um cantinho, uma canção, uma gente. Um esconderijo, ou abrigo. Tanto faz.
Algo ou alguém, dentro ou fora. Que seja bálsamo. E cura. 
Um lugar a ser cultivado, regado, preservado.
Onde seja possível, ainda,  se reconectar. E reabastecer-se de tudo o que importa de verdade.
Amor, sorrisos e paz. Nada mais.
Porque o resto é isso, apenas. O resto. É só um tanto de luta, concreto e asfalto. 
É duro. E dói.
Como dói.

Dani Altmayer

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