sexta-feira, 18 de maio de 2018

Antídoto


(mais uma de consultório)

Dona M. tem 87 anos e os olhos muito azuis. Vive sozinha, é viúva há algum tempo, não teve filhos. A sobrinha mora do outro lado da cidade mas ela tem amigas queridas e vizinhas muito legais, está na consulta acompanhada de uma delas. Tem uma forte rede de apoio e desfruta do consistente afeto feminino. Ainda assim, me conta, não é fácil perder tanta coisa/gente pelo caminho. Às vezes acha que não vale a pena estar chegando tão longe.
- A gente vive com saudade.
Mas são momentos que duram pouco, não se entrega à tristeza. Pergunto o que ela faz para se divertir. Muito lúcida,  me diz que lê bastante: começa de manhã pelo jornal e termina à noite com o romance do momento nos braços.
- Quando sinto a solidão se aproximar eu abro um livro, doutora.

Eu também, dona M. Desde sempre, e (assim espero) para sempre.

Daniela Altmayer

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