sábado, 12 de fevereiro de 2022

Do outro lado da rua




Embaixo de uma árvore, a calçada escaldante ao sol das treze horas, uma família: mãe, pai, bebê. Sentados sob a sombra parca, eu na pressa de não atrasar para o plantão, pego no colo o recalcitrante e idoso shitzu e me preparo para atravessar a rua. Ela pede ajuda. Fala em espanhol. Não é daqui, é de algures. Imigrante, refugiada, latina. Digo que vou ver. O suor e a máscara me incomodam, entro em casa e espio pela janela os três sob a bergamoteira. Não é tempo de bergamotas, que lástima.

Hoje não fiz almoço, comi um sanduíche de preguiça. Também não fiz super, a  geladeira está vazia. Pego uma garrafa de água gelada, algumas bananas, uma barra de chocolate e uns 5 reais em moedas que consigo catar.
Agora tem também uma menina sentada na calçada, na frente deles. Uma jovem bonita, de seus vinte anos. Ela me diz, mostrando um maço de notas, estou ajudando eles a contar o dinheiro. Alcanço para ela as moedas, a mãe agradece o chocolate e as bananas. Descasca uma. A criança come com a avidez de quem tem fome.
Volto para casa, a garota fica. É tão raro alguém ficar. Vejo da sala que está brincando com o bebê, enquanto conversa com os pais. Está atenta, talvez ouvindo a história deles.
É tão raro alguém ouvir.
Saio para trabalhar e ainda estão lá, a moça desconhecida e os estrangeiros.
Na quase sombra de um fevereiro sem refúgio, como é raro alguém te olhar. 

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