sábado, 24 de abril de 2021

Gatilho


Vejo uma fotografia nas lembranças. 


Uma foto antiga, dez anos atrás. Mais colágeno, com certeza. Onde foram parar as bochechas? Pensar que tem gente que paga para se livrar delas, não julgo mas não entendo. Eles não sabem a falta que vão fazer, lá adiante.O cabelo mais comprido, mais cheio ( ah, hormônios, por que me abandonaste?) aquele óculos mais discreto que eu usava porque tu achava meus "olhos tão bonitos, pena que usa óculos." O sorriso sem alegria. Tantos anos ao teu lado, sem muita alegria, driblando teus argumentos com a habilidade de quem nunca jogou bola na vida. Não escrevo com mágoa, não mais, mas a mágoa demorou a passar quase o tanto de anos que passei tentando te curar de ti. Ou seria, tentando me curar de mim?
Eu era infeliz, e não sabia.
Levou tempo e textos inúmeros, até elas  ( a dor, a mágoa, a confusão) irem embora, e deixarem no lugar esta coisa amorfa, inócua, indolor e maravilhosa a que chamamos indiferença.
Quem já esteve preso numa teia de aranha e conseguiu sair, vai me entender.
Hoje eu olho para esta foto e ainda me espanta a ausência de espanto e brilho.
Não trocaria o prazer e as descobertas de hoje por aquela pele mais firme e viçosa.
É uma pele que não me serve mais.
 

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