sábado, 27 de abril de 2019

Amores continuados



veste-se como quem vai embora
acende um charuto e olha devagar
a menina que dorme insolente
na cama recém desfeita 

as pás do ventilador giram lentas
o sol entra pelas frestas da cortina
o calor envolve a nudez quase pura
ela abre os olhos e um sorriso sonolento
murmura seu nome sem resposta

ele sabe que é última vez mas não diz
não tem pesar em seus passos trêmulos
quando abre a porta da rua nós também
sabemos
que ali se cumpre uma espera

despede-se hoje dos amores terrenos
que viu passar como a água do rio
amores de carne e de lua
impregnados de ausência

ela o aguarda tardia
a única mulher que ele amou
(da cintura para cima)
por toda e para o resto
da vida

Retrato de Florentino Ariza

Daniela Altmayer
(oficina de poesia)






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